sábado, 7 de junho de 2008

O calouro

Seres inferiores ou apenas ingênuos? O que propriamente significa ser calouro em uma universidade?

O calouro é um ser extremamente carente. Parecem estar gritando ‘precisa me amar, precisa me amar’ o tempo todo: você pode rir do calouro, engana-lo, sacaneá-lo, usa-lo – ainda assim ele quer muito que você o ame. Ele precisa do seu veterano para ensina-lo a viver no mundo hostil da universidade.

Sair da escolinha, um lugar onde todo mundo te conhece, onde o professor verifica quem faltou na aula passada para repassar a matéria, onde até a diretora te conhece e está disposta a ajuda-lo, merece e precisa de um rito de passagem. É preciso comemorar, mas é preciso crescer também. Assim nasceram os trotes.

No trote, o calouro vai aprender que é preciso um pouco de malicia para viver no mundo, que não se pode confiar inteiramente nas pessoas, e que melhor que seja seus amigos de curso do que estranhos com verdadeiras más intenções. Ele vai ser humilhado, questionado, explorado. O limite do trote depende do curso, das tradições internas, mas também do calouro – ele participa, e é, de certo modo, conivente, afinal ele é o ator principal da sua própria tragédia.

Os calouros poderiam se rebelar, não fazer o que seus veteranos pedem (ou mandam); mas isso significaria ser vaiado e retaliado por todos ao seu redor, e assumir um posicionamento demasiado rígido para sua condição. Precoce demais. Os calouros poderiam se unir, fugir, fazer retalias – mas não sabem como faze-lo. Os calouros não se conhecem, não sabem se organizar.

E também não é essa a escolha deles – como eu disse, eles querem ser amados. O que é um micro-sofrimento passageiro, perto das vantagens e benefícios que você vai conquistar com o passar do tempo? Ganhando seus veteranos, submetendo-se humildemente ou de maneira sarcástica (sim, existem calouros que chegam e fazem por fazer, perguntam, ‘é isso mesmo que você quer que eu faça? Que ridículo, ta bom eu faço, isso vai te fazer feliz? Vai ser meu amigo se eu fizer?’) é garantia de parceria, de amizade e de momentos para lembrar e chorar (de rir) na sua vida.

A partir do final do trote uma nova vida se forma: torna-se adulto, agora a pessoa é responsável pelo seu próprio estudo, seu material, seu almoço; alguns vão começar a trabalhar, outros a fazer carreira acadêmica. Aqui nos despedimos da vidinha infantil da escolinha folhinha feliz e entramos no mundo sórdido e podre da vida adulta. Conhecendo o que há de melhor e pior – sexo, drogas, e musica eletrônica. E aprendemos a ser biólogos, médicos, dentistas, jornalistas, geólogos. Cada um a sua maneira, ao seu ritmo e modo.

Rir do calouro é rir de você mesmo.É reconhecer que um dia você já foi aquilo, já foi ingênuo, bobo, desorientado, carente. E reconhecer que – graças a deus – você mudou. Em um semestre ou um ano se tornou outra coisa. Afinal, com todas as provas e dificuldades, vale a pena estudar.

2 comentários:

Unknown disse...

ah, trote é uma inacreditável perda de tempo quando descambam para a humilhação dos colegas recém chegados. pintar os calouros o os fazer pedir dinheiro é divertido, mas para tudo há um limite.

abração para ti, moça.

.ana disse...

nossa, teu texto me fez recordar do trote que levei qd entrei na faculdade...
não me senti mal, nem humilhada, apesar de ter que fazer coisas ridículas [passar um dente de alho de boca em boca, por ex... sendo que a turma era praticamente só de mulheres ¬¬'].

mas no fim, foi divertido... muita tinta na cara, ovo na cabeça.
e uma coisa típica aqui do sul: chimarrão. eu tinha erva até dentro da calcinha! hahahahahaha...
[que banho demorado pra tirar toda sujeira...]

mas uma coisa importante: tudo isso não surtiu um efeito positivo no sentido de "vamos ser amigas das nossas veteranas"...
foi só um dia divertido, que passou... e que depois nem parecia que tinha acontecido...