terça-feira, 4 de novembro de 2008

Ela.

Nunca se dera conta de sua existência. Simplesmente vivia. Sua inocência fora roubada, e desde então, convivia com a simples e árdua tarefa de dissociar seus sentimentos da ordem prática da vida. Queria ir além, mas aprendera a se limitar. Permitia que se aproximassem, gostava de carinhos, mesmo que eróticos. Mas não admitia se entregar. Amar era demais para si. Não se sentia merecedora de amor. Ou nunca encontrara realmente o significado da palavra.

Não conseguia ir além de seus passos. Mas sua mente alcançava céus e infernos inimaginados. O tempo era relativo, e a sua experiência também. Tinha apenas uns vinte e poucos anos - e, no entanto, o que lhe restava ainda para viver?

Queria paz, mas em tempos de morte e tráfico, esta palavra era proibida. Então: fumava.

E sua fumaça entrelaçava os cachos que moviam seus pensamentos. Certamente tinha uma inteligência inigualável – mas nem mesmo ela admitia isso. Acreditava estar a frente de seu tempo. Mas como, se ainda não aprendera a amar?

Cruzou com um rapaz interessante. Tomou-o para si. Fez de tudo que pode e enlaçou-o entre suas pernas, bem debaixo de suas asas. E construiu sob o ninho um enorme castelo de cartas por cima de sua nuvem de idéias.

Mas ela tinha uma história! E não conseguia deixar de vivê-la. Queria mais, um furacão turbinado moia um motor a sopro dentro do peito. Queria mais, queria sentir-se bem, queria prazer, plenitude. Mas fazia-se em pedaços, e em cada parte de si mesma largava a fúria de uma vida indigesta.

Queria liberdade, mas a liberdade era frouxa demais para alguém que não tinha nada. Tinha medo de morrer, e de gostar. Então, sofria.

Nenhum comentário: