sexta-feira, 25 de abril de 2008

Falando em sonho americano...

Eu quebrei 3 vezes. Da primeira, minha mãe ‘me deu’ dois mil reais para cobrir os cartões de credito. Mas faltaram mil, do salário do meu parceiro, que abandonara o emprego explorador e não recebera um centavo do mês trabalhado. No mês seguinte, entrei mil no cheque especial, que em 3 meses se tornaram 2 mil, e mais 1500 em cartões de credito. Em suma, estava gastando como se nada estivesse acontecendo, e os juros rolaram felizes.

Em seguida, peguei 3 mil de empréstimo, no nome da minha mãe novamente. Duraram 2 meses. No terceiro mês, lá estava eu de novo com mil reais devedor no cheque especial.

Mais uma vez ela me ajudou a pagar as contas devedoras e a pagar o saldo devedor. Vou ter que mudar de banco, e o antigo banco pra onde vou tem mais um saldo devedor de 300 reais. Sei que perto do que eu devi antes, parece pouco, mas a verdade é que eu não consigo parar com 20 reais positivos na conta. E esta realidade é realmente assustadora.

Os bancos e as financeiras são simplesmente ladrões autorizados a torturar e sacanear cada cidadão do país, principalmente aqueles que ganham pouco ou vivem uma vida um pouco normal – com conta no banco, prestações para pagar e alguns sonhos de consumo pequenos. Os gastos que me levaram a tais falências não foram de modo algum ‘grandes luxurias’, mas pequenos mimos, pequenos desejos que se gastaram no percurso, ficando de lembrança apenas os juros. Uma festa, um presente de aniversário, um show, uma bota.

Pra quem entende um pouco de matemática – não precisa ser um expert – sabe que é no juro que reside o lucro do capital especulativo. Um dinheiro que alguém que tem bastante – o banqueiro, por exemplo – empresta pra alguém, contando que no final a pessoa simplesmente não consegue devolver inteiramente, porque á medida que o tempo passa a dívida se torna maior. E assim o dinheiro se multiplica sem muito esforço por parte de quem está ganhando. Isto é o que especialistas chamam de ‘fazer dinheiro’.

Por trás do crescimento do dinheiro de uns poucos, muitos se endividam e praticamente se tornam ‘escravos’ de suas dívidas – trabalham apenas para pagar contas, que nunca diminuem, e continuam trabalhando, ainda mais, e nunca vêem a cor do dinheiro.

Mas o que leva as pessoas a gastarem mais do que realmente podem pagar? Numa palavra, piegas e totalmente ‘comunista’, o consumismo. O consumismo faz com que queiramos comprar coisas com o dinheiro que ainda não temos – o dinheiro do mês seguinte. E no próximo mês queremos continuar gastando, e embora tenhamos as contas do mês anterior pra pagar, pegamos emprestado em financeiras ou cartões de credito, que nos permite ter hoje um produto que só poderemos pagar daqui a um mês (ou meses).

E assim nos presenteamos com objetos comprados com o dinheiro do futuro (quem nunca disse a si mesmo ‘eu mereço esse sapato, eu trabalho muito, sou uma pessoa honesta’?), e nos tornamos escravos desse desejo inacabado.

Enquanto isso, em alguma igreja próxima, prega-se a humildade. Ser humilde não significa apenas aceitar a condição em que se encontra, mas principalmente se contentar com pouco. Ser feliz sem precisar de botas ou filmes, manter-se tranqüilo diante da escassez de comida ou saídas; estar bem consigo mesmo, apesar dos pesares, entender as falhas, suas e dos outros, pois todos erram, e ainda assim, todos estamos juntos nessa.

No final, o que é escroto é dizer palavras que são tidas como inapropriadas, chatas e monótonas, que poderiam estar escritas em um livro comunista, altamente crítico e insatisfatório, ou em um culto evangélico de uma igreja que também lucra com a infelicidade alheia. Insistir em gratidão, em aceitar as conseqüências dos atos passados e principalmente, mudar as ações daqui pra frente, eis um verdadeiro ensinamento bíblico.

Mas, por fim, implorar à consciência, à ética e à auto-critica não parece ser tão ruim assim. Sei que é um exercício continuo, muitas vezes nadando contra a maré (afinal somos bombardeados o tempo inteiro com o que temos que comprar e com o que não podemos ter), mas talvez no fim do túnel exista uma salvação. Acredito que até o início do ano que vem eu consiga pagar tudo que devo e então, comprar a minha libertação. Quem sabe uma viagem, um livro ou apenas uma cadeira nova para o computador? Aí eu terei a escolha, e poder fazer escolhas neste mundo atual é uma coisa bem rara.

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